sexta-feira, 13 de maio de 2022

A Protetora da Humanidade

“Não há nada que a ciência não consiga explicar.”

Em 2019, pouco depois de esta animação estrear, ela já tornou-se popular. Foi comum eu ver notícias e comentários de fã. Mas a arte e comparações com personagens ruins do Maurício de Sousa - como Cebolinha, Cascão, Magali e Mônica - fizeram-me não dar nem uma chance à obra. Mas, passados dois anos, decidi assinar o serviço de vídeo sob demanda Crunchyroll (apesar desta atitude nada profissional da empresa, preciso recomendá-la, pois foi ela quem dublou e é a única que disponibiliza oficialmente Dr. Stone no Brasil) para poder usufruir de episódios dublados de diversos desenhos animados japoneses, além de alguns que só possuem legendas neste magnífico idioma que agora utilizo para escrever.

E… bem, fiquei boquiaberto. Sabia que era uma série de ficção científica e eu sei que os japoneses são geniais em termos tecnológicos, literários e no entretenimento em geral, mas, mesmo assim, fiquei impressionado o quanto Dr. Stone exalta a ciência. Não só a exalta como a explica de forma simples que até uma sociedade primitiva consegue entender. Lembrou-me O Mundo de Beakman por explicar de forma tão lúdica e divertida todos os experimentos científicos e os avanços tecnológicos. Assim como Beakman, Senku é um especialista que faz os espectadores entenderem a realidade.

A humanidade e suas criações, a força de trabalho humana também é exaltada nesta série animada. A cooperação humana é a chave de sua sobrevivência. Não basta a ferramenta se não há quem saiba utilizá-la. Há competição em Dr. Stone, sim, mas não na forma da chatice que são as lutas famosas na animação japonesa. Não, neste desenho, a competição é uma arte, a arte da estratégia. Como um belo jogo de xadrez, o protagonista prevê todos os movimentos que seu adversário dará e os repele magistralmente.

Ah, o protagonista... O que dizer dele? Um dos melhores de toda a animação mundial. Ele não é gentil, nem respeita os sentimentos alheios. Ele é arrogante e não se importa em utilizar o tesouro que é uma das melhores qualidades humanas, a honestidade, para atingir seus objetivos. Ele não é um herói, apesar de realizar tantas proezas heroicas. Ele não é o Doutor, que se sacrifica pelas pessoas que se importa. Senku pode não ser tão carismático quanto um Senhor do Tempo, mas certamente tem a sua inteligência. E Senku consegue salvar todas as vidas utilizando-a. Essa é a sua maior qualidade, seu objetivo é exposto com a maior clareza desde o primeiro episódio: reviver toda a humanidade. E que arma melhor ele poderia usar do que a ciência, a melhor ferramenta ao seu alcance em um mundo de pedra?

O enredo de Dr. Stone é um charme à parte. Se a ciência é sua identidade principal, a trama é a maior motivação para os que não amam conhecer e entender a realidade. Até porque a ciência nada mais é que o estudo e conhecimento prático da realidade. Mas a realidade aqui é adocicada com uma história deliciosa, um bom drama e uma boa comédia que só personagens maravilhosos como o desta série poderiam proporcionar. Em todos os principais e os secundários mais relevantes há uma profundidade de personalidade verossimilhante, cada um complementando os mais diversos tipos de habilidades, fazendo de Senku o líder perfeito para eles, pois o protagonista é genial o bastante para utilizar o coletivo individualmente, explorando o melhor de cada pessoa. Seja matemática ou emocionalmente, instintiva ou estrategicamente, indo da música à força física para alcançar seu principal objetivo.

Enquanto o antagonista prefere utilizar sua inteligência somada ao seu carisma para se tornar facilmente um ditador coletivista, Senku entende a importância do individualismo e não se põe acima de ninguém, inclusive admitindo suas fraquezas. Até porque as fraquezas dele são as fortalezas de seus aliados.
Em uma carta escrita em 19 de março de 1944, Ayn Rand observou: “Fascismo, nazismo, comunismo, e socialismo são apenas variações superficiais do mesmo tema monstruoso – coletivismo”.
A ciência não é apenas uma dádiva humana, ela é quem protege a humanidade. Como o próprio Senku disse, “poder é ciência”. Obviamente, há elementos irrealistas em termos científicos, mas a questão não é, ou não deveria ser, essa. Não importa que, diferente de O Mundo de Beakman, ninguém pode realizar determinadas práticas do Senku e seus aliados. Esta não é uma história educativa no sentido de “aprenda divertindo-se”, mas no sentido de que o espectador pode se inspirar no protagonista de uma série animada muito empolgante e, com 10 bilhões por cento de certeza, ter a curiosidade e a motivação de estudar e entender a realidade ao seu redor para fazer coisas que a mera força física sozinha não poderia. Este desenho animado não se propõe a ensinar a realidade, mas a motivar o seu estudo. Até porque em várias cenas é lembrado que o Senku passou a maior parte de sua existência estudando e fazendo experimentos científicos, e foi isso que o tornou um gênio capaz de liderar um reino contra a tirania de uma visão distorcida da realidade. O que derrota os devaneios coletivistas do Tsukasa é a estratégia baseada no conhecimento da realidade. Isso é coerência interna e verossimilhança, apesar de certas pessoas discordarem. Contudo, ignoro-as e recomendo o mesmo para quem está lendo este texto simplório. Ao contrário dos personagens que, apesar de simples, não são nem um pouco simplistas.

Voltando ao antagonista das primeiras duas temporadas, seus achismos coincidem com os de pessoas reais, como os histéricos ambientalistas que acham que o planeta não suporta o jeito humano de viver, por isso é necessário sacrificar vidas. Alguns indivíduos até chegam ao pior ódio que existe nessa imaginária defesa da natureza: a misantropia. Claro, no mundo real, esses antagonistas da humanidade não negam a ciência nem o conforto que ela provém, apenas regozijam-se em sua hipocrisia, negando evidências científicas que não são de seu agrado. Mas voltemos à Dr. Stone: um antagonista tem o mau-caratismo de afirmar que a Terra não suporta 7 bilhões de humanos. No que o protagonista responde, "se não pudermos sustentar 7 bilhões de pessoas, todas as sete bilhões de pessoas vão procurar formas de sustentar elas mesmas. É assim que a ciência sempre funciona." O grandalhão do Taiju sempre diz “matar pessoas não é uma coisa boa.” Óbvio que não, mas como bem indagou Bertolt Brecht, “Que tempos são estes, em que temos que defender o óbvio?”

Com essa proteção, podemos usufruir de confortos antes inimagináveis e o privilégio de nos autoconhecer, sem preocupações de ameaças externas. Todavia, a ciência em si não é boa nem má, é apenas uma ferramenta. Se a maioria da humanidade fosse má, ela nunca poderia servir à sua própria proteção, apenas à sua destruição.

E é por tudo isso que eu considero Dr. Stone o melhor desenho animado da atualidade. Poderia ter feito mais sucesso? Sim, mas acredito que o alcance que ele teve já foi o suficiente. Se conseguiu me alcançar, já basta para mim. Pode alcançar qualquer um. E que este meu simples, porém maior do que eu pretendia, texto seja um fator que eleve ainda mais o alcance de mais pessoas para a descoberta de que a ciência é a protetora da humanidade; que sem o estudo e o conhecimento da realidade que nos cerca, pouco poderíamos fazer, poucos poderíamos ajudar.

E, como já é de praxe, utilizo este último parágrafo para exaltar a dublagem brasileira. O ator que interpreta o gênio Senku é Felipe Grinnan, que já dublou o Homem-Aranha em algumas animações e foi a voz recorrente de Drake Bell, protagonista da marcante Drake & Josh. Alex Minei dubla Taiju Oki, mas também interpreta o grande pequeno homem Mineta, de Minha Academia de Heróis. Além disso, Alex é a voz original do Cebolinha no desenho da Turma da Mônica Jovem. A gracinha da Yuzuriha é dublada pela igualmente fofa Isabella Guarnieri, filha do Tatá, que dublou o Décimo Segundo Doutor. Isabella também interpreta a Nezuko, a sensual Himiko Toga, da mesma franquia de Mineta, e Lucy Cartwright, personagem de dois bons episódios de uma temporada ruim de Dr. Who. Arthur Machado dubla Tsukasa, assim como Veldora Tempest, o Dragão do Vendaval, do desenho That Time I Got Reincarnated as a Slime e o modesto mordomo Sebastian Michaells de Black Butler. O mentalista Gen Asagiri é dublado pelo Daniel Figueira, a voz de Tanjiro Kamado e do herói Origami Cyclone de Tiger & Bunny. Quem dubla o cienceiro Chrome é o Renan Alonso, o grande Herói de Escudo e o elfo Dearia de Dragon Goes House-Hunting. A dubladora da gorilona Kohaku é a Luísa Horta, que também dá voz à Ochaco Uraraka, colega de Mineta, e Maho Hiyajo de Steins;Gate 0. O velho Kaseki tem a voz do Carlos Seidl, dublador notoriamente conhecido por ter emprestado a voz para Seu Madruga na série Chaves, mas não só a ele; as dublagens do Major Monograma de Phineas e Ferb e do Azmuth de Ben 10 são dele. Bruno Azevedo dubla o paizão do protagonista, Byakuya Ishigami. Bruno cujo trabalho também está presente em That Time I Got Reincarnated as a Slime, no personagem Ifrit, assim como no Manticora de Dragon Goes House-Hunting.

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