sábado, 28 de outubro de 2023

Cântico

Este é um Simples Comentário, para saber mais, leia a introdução.

Anthem

1937 e 1946

EUA e Inglaterra

Cântico se passa num futuro em que impera uma ordem governamental totalitária de tipo fasci-comunista, mas que não tem um nome específico. O tema central da história é o conflito do indivíduo contra o coletivo, elemento onipresente na obra da autora e fundante da moralidade e da filosofia política de Rand, o objetivismo. Que Ayn Rand queira fazer uma devoção ao ego humano está em consonância com os princípios básicos de sua filosofia, a saber: a razão, o individualismo, a volição, a sustentação de valores que não contradizem a razão etc. Embora Cântico seja, em termos de concepção, temporalmente anterior a A nascente (1943) e a A revolta de Atlas (1957), os princípios básicos citados já estão nítidos na obra: o indivíduo heroico que se revolta contra a ordem política totalitária, o brilhantismo individual que o conduz a ações “socialmente erradas”, a punição e a perseguição pela virtude. — André Assi Barreto

Cinco Estrelas

Os poucos defeitos que existem não me incomodam

💕

Esta é uma história de amor proibido. Amor próprio, no caso; apesar de haver uma parceira romântica para o protagonista. Uma história curta, mas bem agradável. Quase um conto. Eu conheci Ayn Rand pelo YouTube, depois pelo Instagram, onde conheci um professor de filosofia que me incentivou a comprar um livro da filósofa. Demorei um pouco de ler, mas foi com alegria que concluí a leitura.

Contudo, antes de prosseguir comentando sobre o texto de Ayn Rand, quero criticar a “introdução” de André Assi Barreto. Ela não é completamente inútil, mas certamente é dispensável. Mas o pior é que, nesta edição brasileira, ela antecede o texto de Ayn. Pergunto-me por que o texto de Assi não foi colocado depois como um posfácio, se comenta e complementa a posteriori a história de Rand. Minha intuição de deixar para ler depois tal introdução foi acertada. Além de eu não recomendar sua leitura para antes da do texto de Ayn, também discordo da falha tentativa de que "a mensagem [de Ayn] é tão urgente quanto o era à época". Inclusive, ao ler Cântico, minha sensação foi de alívio por desfrutar de liberdades que o protagonista não tinha. Apesar disso, Barreto comenta também sobre outras obras de Rand, o que é um estímulo para lê-las. Assim como a filosofia criada por ela, o objetivismo. Por isso recomendo a leitura dessa “introdução” somente depois do que foi escrito pela filósofa.

“Cântico é um quadro fiel do que Rand viu enquanto esteve na Rússia, e do que o mundo pode vir a ser caso esse caminho siga sendo trilhado.” escreve André, que é uma ótima síntese do livro. A escritora saiu da então União Soviética na década de 1920 e se opôs ao coletivismo que lá reinava, por isso começou a escrever, para alertar dos perigos que esses sistemas provocam.

A tradução é boa, apesar de ter mínimos erros de português e não obedecer ao acordo ortográfico de 2009, mesmo que a edição que li tenha sido publicada 10 anos depois dele. Todavia, é até saudoso ler palavras com a ortografia antiga, remete-me à minha infância, então eu não diria que me incomodou.

Aviso: este texto contém revelações sobre o enredo.

Assim como na introdução da edição que li.

Este livro é uma ficção científica, uma jornada de autodescoberta, onde só o protagonista tem uma personalidade evidente. Não que isso seja ruim, pois foca no indivíduo que liberta-se das amarras sociais e da ditadura para escolher sozinho o que quer fazer e com quem. O narrador em primeira pessoa não tem nenhum pronome na primeira pessoa para usar, pois isso foi suprimido pelo governo autoritário, como é descrito na nota da primeira página da história. Não chega a ser um clímax quando o protagonista Inconquistado descobre a palavra “eu”, o que já era óbvio de acontecer desde que li a nota anteriormente mencionada, “mas um evento interno, um processo de cognição” como escreve Peikoff.

Inconquistado, - ou Prometeu, como ele resolve chamar-se no último capítulo – é um indivíduo por excelência, um herói que, mesmo sendo ensinado desde criança que deveria ser igual aos outros, sabe de suas diferenças e não tem vergonha delas. Quando ele descobre um túnel e consegue realizar experiências científicas, a felicidade reina nele. “Os segredos deste planeta não estão à disposição de todos os homens, mas apenas daqueles que os buscam.” diz ele. Ayn Rand foi muito criativa a elaborar essa decadência tecnológica em uma sociedade onde o coletivo prevalece e o indivíduo sofre, diferente de outras distopias, como Metropolis de Fritz Lang.

Em dado momento, Prometeu resolve compartilhar sua invenção – uma lâmpada - com seus irmãos, mas eles a rejeitam com a desculpa de pode prejudicar os produtores de velas. Isso é extremamente atual. Nos últimos anos, com a tecnologia sempre cada vez mais avançada, não é essa a preocupação de muitos, de perder os antigos empregos? Mas novos empregos vão surgindo, então desconsidero que haja fatos que corroborem a preocupação.

Frustrado com a imbecilidade de seus irmãos, Inconquistado foge para a Floresta Desconhecida, onde nenhum homem jamais voltou. Excelente, sua paixão, segue-o e juntos encontram uma casa que tomam por sua. Lá, livros de tempos antigos são descobertos pelo protagonista que os lê com grande prazer e aprende muito mais do que aprendeu com seus professores e demais irmãos. O penúltimo capítulo aparenta ser uma parte de um livro que o protagonista encontra em sua nova moradia pela dissonância com o resto do formato da história, entretanto, no último capítulo, o nosso herói volta a escrever sobre sua jornada: ele conclui que o indivíduo não pode ser preso pelo coletivo, seja este deuses ou reis ou raça. Uma pequena amostra do objetivismo.

Há alguns trechos sem nexo, que me deixaram um pouco confuso, mas, no geral, é um texto coerente que narra um belo autoconhecimento. Ayn Rand escreve bem, tanto que me emocionou em várias passagens do livro.

Por último quero citar alguns nomes de personagens do livro, pois são um espetáculo à parte: Democracia, Liberdade, Unanimidade, Coletivo, Fraternidade, Internacional, Solidariedade e União. Ri muito dessas nomenclaturas, pois são propaladas aos montes pelos coletivistas.